quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

 
 Anne Julie Aubry

A Minha Felicidade


Depois de estar cansado de procurar
Aprendi a encontrar.
Depois de um vento me ter feito frente
Navego com todos os ventos.


Friedrich Nietzsche,
in "A Gaia Ciência"


Anne Julie Aubry


Sabedoria do Mundo


Não fiques em terreno plano.
Não subas muito alto.
O mais belo olhar sobre o mundo
Está a meia encosta.


Friedrich Nietzsche,
in "A Gaia Ciência"


 
Angelique Houtkamp

As Minhas Rosas


Sim! a minha ventura quer dar felicidade;
Não é isso que deseja toda a ventura?
Quereis colher as minhas rosas?
Baixai-vos então, escondei-vos,
Entre as rochas e os espinheiros,
E chupai muitas vezes os dedos.
Porque a minha ventura é maligna,
Porque a minha ventura é pérfida.
Quereis apanhar as minhas rosas?


Friedrich Nietzsche,
in "A Gaia Ciência"

 
Anke Merzback 



Remédio para o Pessimismo


Queixas-te porque não encontras nada a teu gosto?
São então sempre os teus velhos caprichos
Ouço-te praguejar, gritar e escarrar...
Estou esgotado, o meu coração despedaça-se.
Ouve, meu caro, decide-te livremente.
A engolir um sapinho bem gordinho,
De uma só vez e sem olhar.
É remédio soberano para a dispepsia.



Friedrich Nietzsche,
in "A Gaia Ciência"


 
Angelique Houtkamp


Consolação para os Principiantes


Vede a criança, rodeada de porcos a grunhir,
Desarmada, encolhendo os dedos dos pés.
Chora, não sabe fazer mais nada senão chorar.
Será alguma vez capaz de ficar de pé e de caminhar?
Coragem! E depressa, penso eu,
Podereis ver a criança dançar;
Logo que conseguir manter-se de pé,
Haveis de a ver caminhar de cabeça para baixo.


Friedrich Nietzsche,
in "A Gaia Ciência"


 
Angelique Houtkamp


Contra as Leis


A partir de hoje penduro ao pescoço
Com uma corda de crina o relógio que marca as horas;
A partir de hoje cessam o curso das estrelas
E do sol, e o canto do galo e a sombra;
E tudo aquilo que a hora nunca anunciou
Está agora mudo, surdo e cego:
Toda a natureza se cala para mim
Diante do tique-taque da lei e da hora.


Friedrich Nietzsche,
in "A Gaia Ciência"
 
 Panikanova



Ecce Homo


Sim, sei de onde venho!
Insatisfeito com a labareda
Ardo para me consumir.
Aquilo em que toco torna-se luz,
Carvão aquilo que abandono:
Sou certamente labareda. 


Friedrich Nietzsche,
in "A Gaia Ciência"


 
 Panikanova

Moral Estelar


Predestinada à tua órbita,
Que te importa, estrela, a noite?
Rola, bem-aventurada, através do tempo!
Que a sua miséria te permaneça estranha.
A tua luz está destinada ao mais distante dos mundos:
A piedade deve ser-te um pecado.
Admite apenas uma lei: sê pura!



Friedrich Nietzsche,
in "A Gaia Ciência"



 
Vocação de Poeta


Recentemente, ao repousar
Sob essa folhagem
Ouvi bater, tique taque,
Suavemente, como em compasso.
Aborrecido, fiz uma careta,
Depois, abandonando-me,
Acabei, como um poeta,
Por imitar o mesmo tique taque.

Ouvindo assim, upa,
Saltar as sílabas,
Desatei de repente a rir,
Durante um bom quarto de hora.
Tu poeta? Tu poeta?
Estarás assim mal da cabeça?
«Sim, senhor, você é poeta»,
Diz Pic, o Pássaro, encolhendo os ombros.

Quem espero eu sob este arbusto?
Quem estarei a espreitar como um ladrão?
Uma palavra? Uma imagem?
Logo a minha ruína aparece.
Nada do que rasteja, ou que saltite
Escapa ao impulso dos meus versos,
«Sim, senhor, você é poeta»,
Diz Pic, o Pássaro, encolhendo os ombros.

A rima é como uma flecha,
Que temor, que tremor,
Ao penetrar no coração,
Lagarto a contorcer-se!
Morrereis assim, pobres diabos,
Ou ficareis embriagados,
 «Sim, senhor, você é poeta»,
Diz Pic, o Pássaro, encolhendo os ombros.

Versículos informes que se atropelam,
Pequenas palavras loucas, que efervescência
Até que, linha a linha,
Pendeis todas do meu tique taque.
Haverá espantalhos
A quem isso diverte? Os poetas serão impiedosos?
«Sim, senhor, você é poeta»,
Diz, Pic, o Pássaro, encolhendo os ombros.

Troças, Pássaro? Apetece-te rir?
O meu cérebro já tão doente,
Estará o coração ainda pior?
Ah! receia, teme o meu rancor.
Mesmo no íntimo da cólera,
O poeta rima a direito.
«Sim, senhor, você é poeta»,
Diz Pic, o Pássaro, encolhendo os ombros.



Friedrich Nietzsche,
in "A Gaia Ciência"


 
Alison Canson

A Piedosa Beppa


Enquanto o meu corpo for belo
É pecado ser piedosa,
É sabido que Deus gosta das mulheres,
E das bonitas sobretudo.
Ele perdoará, tenho a certeza,
Facilmente ao pobre fradezinho
Que tanto procura a minha companhia
Como muitos outros fradezinhos.


Não é um velhorro padre da Igreja,             .
Não, é jovem, muitas vezes vermelho,
Muitas vezes, apesar da mais cinzenta tristeza,
Pleno de desejo e de ciúme.
Não gosto dos velhos.
Ele não gosta das velhas:
Que admiráveis e sábios
São os caminhos do Senhor!


A Igreja sabe viver,
Sonda os corações e os rostos,
Insiste em perdoar-me...
Quem não me perdoará, então?
Três palavras na ponta da língua,
Uma reverência e ide embora:
O pecado deste minuto
Apagará o antigo.


Bendito seja Deus na Terra,
Gosta das raparigas bonitas
E perdoa de bom grado
Os tormentos do amor.
Enquanto o meu corpo for belo
É pena ser piedosa;
Case o diabo comigo
Quando eu já não tiver dentes.



Friedrich Nietzsche,
in "A Gaia Ciência"


 
Narchan Nair



Declaração de Amor
(e o poeta cai na armadilha)


Ó maravilha! Voará ainda?
Sobe e as suas asas não se mexem?
Quem é então que o leva e faz subir?
Que fim tem ele, caminho ou rédea, agora?

Como a estrela e a eternidade
Vive nas alturas de que se afasta a vida,
Compassivo, mesmo para com a inveja...
E quem o vê subir sobe também alto.

Ó albatroz! Ó minha ave!
Um desejo eterno me empurra para os cimos
Pensei em ti e chorei.
Chorei mais e mais... Sim, eu amo-te!



Friedrich Nietzsche,
in "A Gaia Ciência"
 

Estas Almas Incertas



Quero um mal de morte
A estas almas incertas.
Tortura-as a honra que vos fazem,
Pesam-lhes, dão-lhe vergonha os seus louvores.
Porque não vivo
Preso à sua trela,
Saúdam-me com um olhar agridoce.
Onde passa uma inveja sem esperança.

Ah! Porque não me amaldiçoam!
Porque não me viram francamente as costas!
Aqueles olhos suplicantes e extraviados
Hão-de enganar-se sempre a meu respeito.



Friedrich Nietzsche, in "A Gaia Ciência"
 


 

Ó Minha Felicidade


Revejo os pombos de São Marcos:
A praça está silenciosa; ali se repousa a manhã.
Indolentemente envio os meus cantos para o seio da suave
                                                                                     frescura,
Como enxames de pombos para o azul
Depois torno a chamá-los
Para prender mais uma rima às suas penas.
— Ó minha felicidade! Ó minha felicidade!

Calmo céu, céu azul-claro, céu de seda,
Planas, protector, sobre o edifício multicor
De que gosto, que digo eu?... Que receio, que invejo...
Como seria feliz bebendo-lhe a alma!
Alguma vez lha devolveria?
Não, não falemos disso, ó maravilha dos olhos!
— Ó minha felicidade! Ó minha felicidade!

Severa torre, que impulso leonino
Te levantou ali, triunfante e sem custo!
Dominas a praça com o som profundo dos teus sinos...
Serias, em francês, o seu «accent aigu»!
Se, como tu, eu ficasse aqui,
Saberia a seda que me prende...
— Ó minha felicidade! Ó minha felicidade!

Afasta-te, música. Deixa primeiro as sombras engrossar
E crescer até a noite escura e tépida.
É ainda muito cedo para ti, os teus arabescos de ouro
Ainda não cintilam no seu esplendor de rosa;
Resta ainda muito dia,
Muito dia para os poetas, fantasmas e solitários.
— Ó minha felicidade! Ó minha felicidade!



Friedrich Nietzsche, in "A Gaia Ciência"


quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010


Creio que aqueles que mais entendem de felicidade são as
borboletas e as bolhas de sabão...
Ver girar essas pequenas almas leves, loucas, graciosas e
que se movem é o que, de mim, arrancam lágrimas e canções.
Eu só poderia acreditar em um Deus que soubesse dançar.
E quando vi meu demônio, pareceu-me sério, grave, profundo,
solene.Era o espírito da gravidade. Ele é que faz cair todas as coisas.
Não é com ira, mas com riso que se mata. Coragem!
Vamos matar o espírito da gravidade!
Eu aprendi a andar. Desde então, passei por mim a correr.
Eu aprendi a voar. Desde então, não quero que me empurrem
para mudar de lugar.
Agora sou leve, agora vôo, agora vejo por baixo de mim mesmo,
agora um Deus dança em mim!


Friederich Nietzsche

Rassouli

Cor Lilás

Minha foto
Só Eu tenho pena da Lua! Tanta pena, coitadinha, Quando tão branca, na rua A vejo chorar sozinha!... As rosas nas alamedas, E os lilases cor da neve Confidenciam de leve E lembram arfar de sedas Só a triste, coitadinha... Tão triste na minha rua Lá anda a chorar sozinha ... Eu chego então à janela: E fico a olhar para a lua... E fico a chorar com ela! ... Florbela Espanca